Friday, August 30, 2013

Embora

- Lá (no exterior) é tudo bom, mas é ruim. Aqui (no Brasil) mesmo que esteja tudo ruim, ainda é bom. 
Isso disse o ilustre desconhecido sentado a minha frente com quem eu conversei por algumas horas.
É uma ilusão provocada pelo ambiente de cidade pequena, pensarmos que conhecemos todas as pessoas apenas por te-las visto na rua, ou escutado alguns fatos sobre a elas. A tecnologia ainda veio e piorou tudo. Muita gente passou a acreditar que o perfil no Facebook é uma reflexo exato de quem por ele se representa, e sendo assim, se sentem livres para tirar conclusões baseadas em frases aleatórias ou fotos pré-selecionadas. Por essas e outras, eu ainda prefiro conhecer as pessoas da maneira antiga...
A frase dita pelo ilustre então conhecido conseguiu marcar a minha memória de tal forma que me incomodou no dia seguinte e no outro também.
Somado a isto, estavam todas as recordações daquelas sete semanas em casa com a família, o passado se ajuntando com o presente para determinar o futuro - que na verdade já estava determinado por Deus desde muito tempo...
Mas de qualquer forma, eu precisava pegar o avião naquele final de semana, para regressar a Alemanha e resolver algumas questões de documentação ainda pendentes.

Praia Catarina, em Ilha Solteira - SP.

Tuesday, August 27, 2013

Baby Tea

Mamadeiras cheias de amêndoas,
tubinhos de jujubas,
brigadeiros de nozes,
fraldas e mais fraldas.

Era o chá de bebe da uma amiga antiga, que também foi a ocasião perfeita para re-encontrar muitos outros amigos antigos de uma só vez. 
Tudo em rosa e marrom. 
Enquanto eu morava na Europa, muitos dos meus amigos se casaram. Outros, tiveram filhos que até então eu não conhecia. Crianças lindas que cresceram e se tornaram parecidos com os pais. 
Rosas brancas nos vasos.
Era uma alegria poder ver tantas pessoas tao queridas novamente. Meu coração se alegrava em ver que estavam todos bem e guardados por Deus.
Paes de mel com chocolate. 
Continuo acreditando que as pessoas do nosso passado é que nos ajudam a entender quem realmente somos no presente. São eles com quem dividimos a nossa história ou pelo menos parte dela. Quanto mais velhos ficamos, mais precisamos dessas pessoas. Funciona como um certo tipo de identidade. 
Bolo de coco embrulhadinho. 
Eu estava de volta, imersa na cultura brasileira novamente. Era um sentimento de retorno. Um prazer poder participar daqueles momentos que antes eu só veria por fotos no Facebook. 
Mousse de maracujá. 
Ao mesmo tempo, o sentimento era de ser um peixe fora d'água dentro de seu próprio aquário cheio. 
Parecia que a minha vida havia andado alguns quilômetros para frente enquanto eu havia corrido em outra direção. 
Durante as conversas, algumas palavras e expressões me escapavam ao entendimento. 
De igual maneira, alguns fatos demoravam para fazer sentido. 
Foi então que pude compreender que toda cultura evolui com o passar do tempo. A mudança é certa e ocorre com todos. O Brasil que eu havia deixado era diferente do Brasil que eu encontrava naquele momento. Ainda sim, era o meu aquário. 

Sunday, August 25, 2013

No mercado...

- A Senhora se esqueceu de pesar as bananas. 
- Pesar? 
- Tem que passar na balança antes de vir para o caixa. 

Sim, eu havia me esquecido que, naquele supermercado, os fregueses tem que entrar em uma fila para pesar os vegetais e depois em outra para pagar por eles. Por anos sempre foi assim e nunca ninguém havia reclamado.
Também é de se surpreender que as pessoas não costumem reclamar dos preços exorbitantes de alguns artigos supérfluos. Pelo contrário, os adquirem como se fossem produtos de luxo!
E lá estava eu, fazendo turismo de supermercado, tirando fotos das prateleiras...





"Naturalmente" coloridas...
Aos meus olhos, parece que quanto maior o nível de desigualdade social, maior é o desejo de ostentação.
Voltar ao Brasil significaria ter que se acostumar com tudo isso novamente?
Significaria se conformar com uma realidade que foge da lógica quando observada através de um outro contexto?

Thursday, August 22, 2013

Riquezas

"Only hate the road when you're missing home"
(Passenger)

Entramos de braços dados na pequena igreja presbiteriana de São Manuel, minha avó e eu. Nos sentamos no segundo banco da fileira. Antes do culto começar, ela acariciou minha mão e disse:
- Vejo que você ainda usa o anel que te dei quando você era uma menina. Guarde-o bem, é um anel valioso.
Na casa da vó: churrasco, frango defumado, bacalhoada... A marca registrada da família é o exagero de comida.
Mais valioso que o anel, era para mim aquele momento.
Família é a  maior riqueza que alguém pode ter. São as pessoas que nos moldaram ao longo dos anos, que nos aguentaram nas piores fases, são os amigos que Deus escolheu para carregarmos por toda vida.
Pude então perceber o quão difícil era ficar longe dessa estrutura e o quanto isso me fazia falta...

Jogando UNO com os irmãos... Quem nunca? 

Wednesday, August 21, 2013

Be still...

Precisei desviar de um ciclista que vinha lentamente pela contra-mão na avenida. O senhor, de aparência bastante humilde, não aparentava se quer perceber que conduzia seu veículo de maneira inadequada. 
- Hallo Opa! Das kann nicht sein! - gritei eu pela janela do carro, sem perceber que falava no idioma errado. 
Os anos fora do país me tornaram uma pessoa ainda mais crítica do que antes. O meu nervosismo era aparente também na fila do supermercado e em outros estabelecimentos comerciais. As pessoas pareciam não se incomodar em fazer os outros perderem tempo. Tal fato não fazia muito sentido para mim, que estava de longas férias. Mas de igual maneira, como se eu fosse a mais ocupada das bussiness women, uma inquietação começou a tomar conta do meu coração e um sentimento de necessidade de fuga começava a surgir. "Preciso ir embora daqui" - era o que eu pensava. 
No final de semana, fui a um lugar que já há algum tempo não visitava com muita frequência: a igreja. Na Alemanha nós temos um pequeno grupo brasileiro de cristãos que se reúne todas as semanas e aos domingos eu costumava frequentar uma igreja alemã. Mas nada se compara a voltar a sua comunidade local - rever as pessoas tão queridas, notar que as crianças cresceram, receber um abraço dos idosos... E esse foi o lugar que me acalmou. Era como se Deus me dissesse: se aquiete, se aquiete... 

Encontrar as mesmas pessoas de 10 anos atras, não tem preço...

Monday, August 19, 2013

Welcome

Estiquei o meu braço até conseguir alcançar aquela caixa velha no fundo do guarda-roupas. Sentada no chão, fui então desenterrando os tesouros que estavam lá dentro. Fotos, diários antigos, e outras coisas das minhas coisas de menina.
O cheiro de alho com cebola refogando vinha da cozinha me lembrando que um almoço preparado pela mamãe seria saboreado em breve.
Era como ser criança novamente. Assistir televisão, conversar com a vovó e fazer outras coisas que eu antes havia me esquecido. Como os últimos anos da minha vida haviam sido bastante corridos, ter tempo para o tempo era algo que eu desconhecia e isso logo começou a me incomodar.
Porém em poucos dias aquelas questões básicas da vida adulta vieram me atrapalhar novamente: Emprego? Dinheiro? Carreira? Elas martelavam minha mente incessantemente numa condição também conhecida como "stress". Sim, eu precisava mesmo descansar e estava no lugar certo para isso.
Assim como existe um tempo certo para cada coisa, também existe um tempo de não fazer muita coisa.
Fácil falar. Difícil aceitar. Especialmente no meu caso.
Mas eu havia separado aquelas sete semanas para ficar na casa dos meus pais e poder então me decidir se iria me estabelecer no Brasil ou na Alemanha.
Era o meu tempo de aquietar.

Friday, August 16, 2013

Home sweet home

Apesar de já ser final de maio, a primavera havia se atrasado naquele ano. O brilho fraco do sol e os poucos graus Célcios daquela tarde me faziam esquecer que algum dia haveria um verão.
A campainha soou com a chegada de uma amiga quem me levaria ao aeroporto. Nós duas arrastamos desajeitadamente as malas pesadas pela escadaria de madeira daquele prédio antigo e partimos. Ou melhor, eu parti. Estava indo para uma temporada na casa de meus pais no Brasil, após o termino do doutorado aqui na Alemanha.
Um avião, outro avião, mais outro e após 32 horas de viagem eu já não conseguia me lembrar porque havia trazido comigo tantos casacos. O outono em Ilha Solteira não parecia estar ainda muito motivado.
Voltar ao meu lugar de origem depois de um longo tempo fora dele foi uma experiencia inusitada. Foi como voltar a Londres após ter passado anos em Nárnia e se deparar com o mundo real antes esquecido. Isto tudo foi também como uma surpresa nostálgica, a redescoberta do velho, que se tornava novo mais uma vez. Juntamente, vem então a parte mais chocante dessa experiencia: o reencontro comigo mesma.
- Ah, eu era assim? Eu falava dessa forma? Eu usava essas roupas? Era isso que eu comia?
A "velha Débora" estava lá e eu nem ao menos me lembrava dela. Neste instante, o momento presente me oferecia a oportunidade de simplesmente esquecer o que havia se passado nos últimos anos fora do país. Mas essa oferta barata eu não poderia aceitar. Não por completo, mas pelo menos uma parcela dela deveria ser incorporada para evitar possíveis conflitos. Então o que se segue pelas semanas seguintes é consequência de um modelo híbrido do meu próprio eu. A mistura havia sido feita e mais uma vez o processo era irreversível.
Por mais estranho que pareca, tudo é apenas parte de um curso normal que se repete em menor intensidade todos os dias. Mudar, faz parte de viver.

Por-do-sol no rio Paraná, em Ilha Solteira-SP.